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Médicos, pacientes e indústria estudam entrar com ação contra nova resolução do CFM sobre cannabis medicinal

20 de Outubro de 2022



Futuro da Saúde

O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou na sexta-feira, 14, uma resolução que altera as regras para a prescrição médica de cannabis medicinal a pacientes. O novo texto permite que apenas o canabidiol (CBD) seja receitado e somente para crianças e adolescentes com epilepsias refratárias às terapias convencionais, ligadas às seguintes condições: síndrome de Dravet, síndrome de Lennox-Gastaut e complexo de esclerose tuberosa.

A resolução levantou críticas de médicos, pacientes e empresas ligadas à cannabis medicinal. Isso porque exclui a possibilidade de prescrição para outras patologias, como espasticidade e dor neuropática, além de vetar que outros componentes sejam receitados, como o tetrahidrocanabinol (THC), que possui indicação para algumas doenças. Outra proibição diz respeito a palestras e cursos. O texto afirma que está vetado que médicos ministrem conteúdos deste tipo fora do ambiente científico.

Ainda, as proibições pelo CFM levantaram a discussão da autonomia médica. Durante a pandemia de Covid-19, o Conselho teve uma posição firme para que médicos brasileiros pudessem recomendar quaisquer tratamentos para a infecção pelo novo coronavírus, mesmo aqueles que não possuiam comprovação científica de sua eficácia. Associações e médicos cobram a mesma postura para a cannabis medicinal.

Movimentações já começam a surgir para tentar derrubar o novo texto por diversas frentes. O Ministério Público Federal instaurou na segunda-feira, 16, um procedimento preparatório para apurar a constitucionalidade da resolução. Na Câmara dos Deputados, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) apresentou um Projeto de Decreto Legislativo para sustar a resolução, assim como fez a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) no Senado. Ainda, associações de pacientes e indústrias já estudam ir à Justiça contra a decisão do Conselho.

O que mudou com a nova resolução sobre cannabis medicinal?

O novo texto publicado na semana passada é semelhante ao da resolução anterior, que era de 2014, mas as principais diferenças estão relacionadas aos vetos e limitações. Apesar de a versão antiga também regulamentar o uso para epilepsias na infância e adolescência refratárias às terapias convencionais, não especificava quais eram elas e não impunha vetos a indicação para outras doenças. Também não vetava cursos e palestras.

“[Essa nova resolução] Foi bastante desrespeitosa à ciência e às inúmeras publicações científicas que aconteceram desde 2014. Quando se propõe a fazer uma atualização, se propõe a fazer uma revisão da literatura, e isso não aconteceu. As referências bibliográficas utilizadas são as mesmas de 2014. Ou seja: foi ignorado os últimos 8 anos de ciência nessa área”, afirma a neurologista Patrícia Montagner, CEO da WeCann Academy, centro de formação de prescritores de cannabis medicinal.

De acordo com a médica, ao menos outras três condições possuem evidências científicas robustas para a utilização de cannabis medicinal. São elas: espasticidade ligada à esclerose múltipla, dor crônica (em especial a neuropática) e sintomas ligados ao tratamento quimioterápico, como náuseas e vômitos. No Brasil, o único medicamento à base de canabinoides registrado na Anvisa, o Mevatyl, possui indicação em bula exatamente para espasticidade moderada a grave relacionada à esclerose múltipla, e sua prescrição estaria vetada com a nova resolução.

Em 2019, o Conselho Federal de Medicina publicou um livro intitulado “A tragédia da maconha: Causas, consequências e prevenção”. Nele, o CFM afirma que existem evidências científicas conclusivas para as condições citadas pela neurologista, com base em informações do National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine e do National Institute on Drug Abuse (Nida), ambas de 2017. Contudo, mesmo essas informações endossadas pelo Conselho não foram levadas em consideração na revisão da resolução.

Patrícia defende ainda que “existem milhares de outros pacientes portadores de outras doenças que foram refratárias às terapêuticas habituais e que hoje estão fazendo uso da cannabis com resultados satisfatórios. Mesmo que não tenhamos evidências científicas tão robustas, é preciso respeitar o resultado clínico satisfatório que alcançaram”.

 

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