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Os desafios da ButanVac, que vai usar 20 milhões de ovos de galinha para produzir 40 milhões de vacinas
10 de Maio de 2021
Correio Braziliense
Ovos de galinha são uma presença constante no Instituto Butantan, em São Paulo: é neles que costumam ser injetados os vírus usados todos os anos na produção da vacina contra a influenza, aplicadas na campanha de vacinação nacional contra a gripe.
Agora, a mesma técnica está sendo repetida na ButanVac, a vacina que o instituto paulista está desenvolvendo contra a covid-19, em um processo que visa produzir e entregar 40 milhões de doses a partir de julho - um prazo por enquanto considerado irreal por alguns especialistas independentes, uma vez que sequer foi testada a eficácia desse novo imunizante em humanos até o momento.
De qualquer modo, para fazer chegar a essa quantidade, terão de passar pelas instalações do Butantan cerca de 20 milhões de ovos de galinha especificamente para a ButanVac - e, em teoria, muitos milhões mais depois disso, quando houver resultados dos testes clínicos da vacina e informações mais concretas a respeito de quão amplo será seu uso contra a covid-19 no Brasil.
Em cada um desses ovos - por enquanto, são 521 mil já entregues ao laboratório paulista por granjas especializadas - está sendo injetada uma pequena quantidade do vírus da "doença de Newcastle", um mal aviário que é inofensivo em humanos.
Esse vírus foi geneticamente modificado para receber a "proteína S" do SARS-CoV-2, ou seja, a estrutura do coronavírus que se encaixa nas células humanas e as infecta, causando a covid-19.
A intenção é que, munido da proteína S do coronavírus, o vírus da doença de Newcastle seja capaz de estimular a produção de anticorpos contra a covid-19 no organismo humano.
E é aí que os ovos de galinha entram na história: é dentro de cada um deles, nos laboratórios do Butantan, que o vírus de Newcastle vai se alimentar e se multiplicar em nível suficiente para produzir (segundo estimativas) duas doses de vacina por ovo.
"O vírus usa as células do embrião do ovo para essa replicação", explica à BBC News Brasil Douglas Gonçalves de Macedo, gerente de produção da fábrica do Butantan onde será feita a ButanVac. "Deixamos o ovo na temperatura ideal, entre 35° e 40° Celsius, para o vírus crescer exponencialmente lá dentro. Depois de 72 horas, ele passa por um processo de purificação (que inclui a inativação do vírus e a diluição do produto final). E disso temos o IFA."
Em teoria, essa tecnologia também será capaz de produzir vacinas eficazes contra as novas variantes do coronavírus, uma vez que se pode escolher de qual cepa (por exemplo, a brasileira P.1) será retirada a proteína S.
Mas para tudo isso se concretizar dentro do cronograma e volume esperados pelo governo paulista, muita coisa ainda falta acontecer: desde a aprovação pela Anvisa até testes clínicos que sejam bem-sucedidos. É aí que começa uma corrida de obstáculos. Por enquanto, "é muita expectativa em cima de algo que ainda não tem nenhum estudo feito em humanos, que é quando teremos ideia de como a vacina funciona", adverte à BBC News Brasil a imunologista Cristina Bonorino, professora titular da Universidade Federal de Ciências de Porto Alegre e membro dos comitês científico e clínico da Sociedade Brasileira de Imunologia.
IFA é a sigla de Ingrediente Farmacêutico Ativo, que o Brasil tem por enquanto importado da Índia e da China para envasar aqui - especificamente os IFAs das vacinas CoronaVac e AstraZeneca, respectivamente no Butantan e na Fiocruz. Extraído do ovo, esse IFA nacional será purificado, diluído e embalado na própria fábrica do Instituto Butantan, no que se espera que seja a primeira vacina integralmente produzida no Brasil contra a covid-19, mais barata e mais facilmente disponível por não depender desse IFA importado, atualmente escasso no mercado internacional.
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